segunda-feira, outubro 25, 2004

Tranquetas e taramelas

Na aldeia de Montesinho

Na aldeia de Rio de Onor

(In)sensibilidades

Ia eu andando por aqui, bisbilhotando os blogues alheios, e nem cheguei a ir muito longe para ficar emocionada. Algures por aqui encontro um médico perturbado porque um seu doente ainda crê poder curar-se, quando já mal lhe restará um ano de vida. Em jeito de mentira piedosa (ou simples omissão…) o besugo deixa-o viver na ilusão de que sim, de que para o ano se repetem os mesmos ciclos da natureza com ele a assistir a pé firme. Porque o César – o doente – assim o crê e o quer. Que aconteceria ao César se o médico lhe dissesse, de uma vez por todas, que se deixasse de quimeras?
Em paralelo, lembro-me da minha amiga T., com 49 anos e que desde os 43 tem passado o seu tempo entre operações e terapias diversas, tendo chegado já à dependência da morfina. Quando se sente com um mínimo de forças e sem dores, arranca para um passeio a qualquer lado, uma ida à discoteca, ou uma simples saltada até à Foz para ver o por-do-sol e comer uma “francesinha”. A T. sabe que vai morrer e isso não a assusta. Vive um dia de cada vez com a mesma avidez com que viveu antes de adoecer. E ficou indignadíssima com um médico que, observando-a pela primeira vez há um ano lhe disse, sem quaisquer escrúpulos, não valer a pena perder tempo com mais operações ou terapias porque ela não teria mais que meia dúzia de meses à sua frente!... Mais que a insensibilidade do médico, foi a secura da declaração, o que chocou a T.
T. e César. Um médico e outro médico. Duas situações semelhantes. Mas também duas formas diametralmente opostas de estes binómios médico-doente conviverem com a mesma realidade, tão diversa tanto no aceitar como no enunciar.