Manuel da Fonseca
Mataram a Tuna
Nos domingos antigos do bibe e pião
Saía a tuna do Zé Jacinto
Tangendo violas e bandolins
Tocando a marcha Almadanim.
Abriam janelas meninas sorrindo
Parava o comércio pelas portas
E os campaniços de vir à vila
Tolhendo os passos escutando em grupo.
Moços da rua tinham pé leve
O burro da nora da Quinta Nova
Espetava orelhas apreensivo
Manuel da Água punha gravata!
Tudo mexia como acordado
Ao som da marcha Almadanim
Cantando a marcha Almadanim.
Quem não sabia aquilo de cor?
A gente cantava assobiava aquilo de cor...
(só a Marianita se enganava
e eu matava-me a ensinar...)
que eu sabia de cor
inteirinha de cor
e para mim domingo não era domingo
era a marcha Almadanim!
Entanto as senhoras não gostavam
Faziam troça dizendo coisas
E os senhores também não gostavam
Faziam má cara para a Tuna:
- que era indecente aquela marcha
parecia até coisa de doidos:
não era música era raiva
aquela marcha de Almadanim.
Mas Zé Jacinto não desistia.
Vinha domingo e a Tuna na rua
Enchendo a rua enchendo as casas.
Voavam fitas coloridas
Raspavam notas violentas
Rasgava a Tuna o quebranto da vila
Tangendo nas violas e bandolins
A heróica marcha de Almadanim!
Meus companheiros de bibe e pião
Agora empregados no comércio
Desenrolando fazenda medindo chita
Agora sentados dobrados nas secretárias do comércio
Cabeças pendidas jovens-velhinhos
Escrevendo no Deve e Haver somando somando
Na vila quieta
Sem vida
Sem nada
Mais que o sossego das falas brandas...
- onde estão os domingos amarelos verdes azuis encarnados
vibrantes tangidos bandolins fitas violas gritos
da heróica marcha de Almadanim?!
Ó meus amigos desgraçados
Se a vida é curta e a morte infinita
Despertemos e vamos
Eia!
Vamos fazer qualquer coisa de louco e heróico
Como era a Tuna do Zé Jacinto
Tocando a marcha Almadanim!