sexta-feira, outubro 01, 2004



Andando por aí, "desencantei" na minha estante esta belíssima obra: SUBSÍDIO PARA O CANCIONEIRO POPULAR DO BAIXO ALENTEJO, recolha e notas de Manuel Joaquim Delgado. Entre milhares de quadras, escolhi estas, e não resisti ao dialecto barranquenho:

Ê fui a labá'ao barrâncu,
Me' ehqueceu du açabão;
Lava-mi cõ água dê roza',
Me ficô u xêru na mão.
(Barrancos)

O rouxinol, quando canta,
Vai cantar à minha horta,
Põe o pé na mejironda
E o bico na catrinota.
(Alvalade)

Umas botas caneleiras,
Uma esteira de atabua,
Uma manta retalheira,
Toda a noite o homem sua.
(Mina da Juliana - Aljustrel)

Dí um ai antre dous montes,
Responderom-m'as montanhas:
Ai de mim qu'ê já não posso
Com saudades tamanhas.
(Quintos)

Quando paçareh pú'u ádru,
Nu dia du mê entrerru,
Dí Z à terra que não gáhti
Ah trânçah du mê cavêlu.
(Barrancos)

As raparigas d'hoje em dia
Não comem senão almece
Bom sapato e boa meia,
A barriga é que padece.
(Messejana)

Aqui e aqui há mais...

O outro Algarve (I)




Quem acha que Algarve é sinónimo de praias, turismo, etc., é porque não conhece as serras e o barrocal.
Na serra do Caldeirão, percorrendo caminhos de terra batida ou estradinhas acanhadas, podíamos encontrar coisas como esta. E também casinhas caiadas de branco, com cruzes brancas pintadas para proteger as colheitas - ritual de origens pagãs que sobreviveu na ruralidade do Algarve interior. Sobreviverá a serra após tantos incêndios?

Outubro



Calaram as cigarras
o vibrante reverbero
das asas de cobre

Sob os aloendros
escondem as rolas
seu canto rolado
antecipando o sabor
das primeiras chuvas.

Só a lua crescente
morde a insónia
com a mesma rebeldia
do trilar dos grilos nocturnos.

Margarida A.