domingo, janeiro 02, 2005

Onésimo Silveira (Cabo Verde)


...........As águas


A chuva regressou pela boca da noite
Da sua grande caminhada
Qual virgem prostituída
Lançou-se desesperada
Nos braços famintos
Das árvores ressequidas!

(Nos braços famintos das árvores
Que eram os braços famintos dos homens...)

Derramou-se sobre as chagas da terra
E pingou das frestas
Do chapéu roto dos desalmados casebres das ilhas
E escorreu do dorso descarnado dos montes!

Desceu pela noite a serenar
A louca, a vagabunda, a pérfida estrela do céu
Até que ao olhar brando e calmo
da manhãNum aceno farto de promessas
Ressurgiu a terra sarada
Ressumando a fartura e a vida!
Nos braços das árvores...
Nos braços dos homens...




...........Quadro

Lá vem nho Cacai da ourela do mar
Acenando a sua desilusão
De todos os continentes!
Ele traz o peito afogado em maresias
E os olhos cansados da distancia das horas...

Lá vem nho Cacai
Com a boca amarga de sal
A boiar o seu corpo morto
Na calmaria da tarde!

Nho Cacai vem alimentar os seus filhos
Com histórias de sereias...
Com histórias das farturas das Américas...

Os seus filhos acreditam nas Américas
E sabem dormir com fome...