Ah, gandas férias!
“Finalmente umas férias no Algarve, que isto não é só para os meus vizinhos do terceiro direito, ou para esse jete-sete que vem nas revistas que a patroa da minha Arlete leva lá para o salão de cabeleireira. E até foi ela que teve a ideia de virmos por aí abaixo, mais os filhos, em vez de passarmos as férias no parque de campismo da Caparica, como temos feito nos últimos dez anos. A gente lá até tem condições, comprámos uma rulote em segunda mão, que até está muito boa e foi barata (o diabo foi convencer o gajo que a vendeu a tirar 20 contos que, bem vistas as coisas, já nem era nova...), mas a minha Arlete e eu já começamos a estar fartos de passar as férias com os meus sogros, e mais os meus cunhados e os miudos aos fim de semana. E mais, eu não sou menos que os outros, porque até comprei um Audi num setande de usados a um amigo dum primo do meu cunhado, que me garantiu que era bom negócio, e tenho que mostrar que a gente não somos nenhuns pindéricos. Tomaram muitos! De maneira que, vai daí, a comadre da patroa da minha Arlete tem uma amiga que sabia duns apartamentos em Armação de Pera, baratos já se sabe, e lá se tratou de tudo: um T1, que chega perfeitamente para a gente os quatro, perto da praia, e dá cá quatrocentos e cinquenta euros por uma semana! Só espero que valha a pena, pois se a minha Arlete não estreia o fato de banho mais as calças e as blusas, para não falar no vestido para ir à noite à esplanada, que comprou à dona Lurdes que vai vender roupas lá ao salão, tudo a pagar em três vezes, bem tenho que a aturar mais à chaga da dona Eulália, a minha sogra.
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“Ora até que enfim! Chegámos e já me vejo lá em baixo na praia a amandar cada mergulho que até deixa as gajas de olhos esgazeados! Pois, que eu também me equipei antes de vir! Uns calções todos modernos, amarelos com uma risca roxa e outra verde, um boné da cor do glorioso, uma toalha que até tem um tigre estampado, e para rematar em beleza, uns óculos reibã, tudo ali da feira do Relógio, que eu já tinha encomendado ao Manel Cigano e ele nunca falta ao prometido.
“O T1 para onde a gente veio é que podia ser melhor, acho-o um bocadito acanhado. Diziam que até tinha garagem, mas o que não disseram é que a garagem é que é o T1! Paciência, o Audi tem que ficar na rua, mas é da maneira que o resto do pessoal cá do prédio até pode ver o carrão da família Pereira. Se calhar só têm uns carritos insignificantes e com mais de cinco anos…
“E a praia nem é assim tão perto, fica a quase meia hora a pé! A minha Sandra Priscila até já ia levando uma lamparina nas ventas por causa do irmão. O meu Fábio Marcelo disse que nem se importava nada, até tem o sequeite, mas ela ficou logo toda encaramelada, que se a gente tem carro não é para andar a pé! Pudera, não lhe custa a pagar a gasolina…
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“Ainda parece que foi ontem que a gente chegou e já estamos a encafuar a tralha toda no carro outra vez. Até já sinto a falta das futeboladas na praia, os chapões na água e o coiro a trabalhar pró bronze… E as sardinhadas, com o tintol que eu arranjei na tasca do fundo da rua, que até é dum gajo da minha terra? E a seguir, praia outra vez, que o tempo passa depressa e há que aproveitar bem o que se gastou. E cá eu e a minha Arlete fizemos um vistão, era todo o pagode a olhar para nós. A minha Sandra Priscila é que ia apanhando com outra lamparina, dizia que estavam era a gozar-nos por fazermos figura de bimbos! Lá porque quer tirar o curso de línguas já se julga mais que o pai e mãe… Que a gente não lhe falte com o pãozinho prá boca, grandessíssima mal-agradecida!
“E como ainda faltam uns quinze dias para acabar as férias, vamos passá-los à terra dos meus sogros, ali ao pé do Bombarral. Isso é que vai sair barato, que lá a gente não paga nada, apesar dos meus sogros estarem sempre a resmungar e a chamar-me gosma entre dentes… Então se a minha Arlete é filha deles, não fazem mais que a obrigação, não é verdade?
“E agora vamos meter à A2, que até Moscavide ainda levo bem duas horas!”
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“Ora até que enfim! Chegámos e já me vejo lá em baixo na praia a amandar cada mergulho que até deixa as gajas de olhos esgazeados! Pois, que eu também me equipei antes de vir! Uns calções todos modernos, amarelos com uma risca roxa e outra verde, um boné da cor do glorioso, uma toalha que até tem um tigre estampado, e para rematar em beleza, uns óculos reibã, tudo ali da feira do Relógio, que eu já tinha encomendado ao Manel Cigano e ele nunca falta ao prometido.
“O T1 para onde a gente veio é que podia ser melhor, acho-o um bocadito acanhado. Diziam que até tinha garagem, mas o que não disseram é que a garagem é que é o T1! Paciência, o Audi tem que ficar na rua, mas é da maneira que o resto do pessoal cá do prédio até pode ver o carrão da família Pereira. Se calhar só têm uns carritos insignificantes e com mais de cinco anos…
“E a praia nem é assim tão perto, fica a quase meia hora a pé! A minha Sandra Priscila até já ia levando uma lamparina nas ventas por causa do irmão. O meu Fábio Marcelo disse que nem se importava nada, até tem o sequeite, mas ela ficou logo toda encaramelada, que se a gente tem carro não é para andar a pé! Pudera, não lhe custa a pagar a gasolina…
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“Ainda parece que foi ontem que a gente chegou e já estamos a encafuar a tralha toda no carro outra vez. Até já sinto a falta das futeboladas na praia, os chapões na água e o coiro a trabalhar pró bronze… E as sardinhadas, com o tintol que eu arranjei na tasca do fundo da rua, que até é dum gajo da minha terra? E a seguir, praia outra vez, que o tempo passa depressa e há que aproveitar bem o que se gastou. E cá eu e a minha Arlete fizemos um vistão, era todo o pagode a olhar para nós. A minha Sandra Priscila é que ia apanhando com outra lamparina, dizia que estavam era a gozar-nos por fazermos figura de bimbos! Lá porque quer tirar o curso de línguas já se julga mais que o pai e mãe… Que a gente não lhe falte com o pãozinho prá boca, grandessíssima mal-agradecida!
“E como ainda faltam uns quinze dias para acabar as férias, vamos passá-los à terra dos meus sogros, ali ao pé do Bombarral. Isso é que vai sair barato, que lá a gente não paga nada, apesar dos meus sogros estarem sempre a resmungar e a chamar-me gosma entre dentes… Então se a minha Arlete é filha deles, não fazem mais que a obrigação, não é verdade?
“E agora vamos meter à A2, que até Moscavide ainda levo bem duas horas!”
5 Opiniões:
e aposto que passaste por olhão.
escrita iberica
Eu não, deus me livre! Mas o Sr, Pereira, mais a sua Arlete, a Sandra Priscila e o Fábio Marcelo, foram de certeza, quanto mais não fosse comer uma dose de berbigão da Ria Formosa, que sempre era mais em conta.
E de sobrenmesa, uns cornetos da Olá...
A tua escrita possui a argúcia de um olhar bistúrico e a ternura de uma ribeira intacta (haverá) de Trás-os-Montes...
Leio sempre com intenso prazer tudo o que escreves. É uma alegria revisitar o teu blog.
Assim não vale! Como poso saber quem comenta os meus "escritos" se se esconde atrás de um "anonymous"?
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