quinta-feira, janeiro 13, 2005

Um poema dos anos '60



Após uma leitura de jornal
Evolução? Progresso? O que nos falta
é a coragem de dizer que fomos
castrados à nascença... Canta, flauta,
às ovelhas puríssimas que somos!
Entretém-nos, trinando, que nos basta
um pouco de erva tenra: a paz vazia
dos motes que repetes... Canta! Arrasta
o rebanho ao redil sem alegria!
Um detergente nos lavou de mais
o rendilhado e curvo pêlo branco.
Depois - tempo de lobos e chacais! -,
um ferro em brasa nos marcou no flanco!
Mas não nos dói na alma satisfeita
por líricos embalos e badalos...
Para a morte que ronda, grilos, ralos
são a morfina tépida e perfeita!
Pacíficos seguimos, baixa a fronte,
coberta de vergonha e suor frio...
- Meu Deus! Não haverá no horizonte
uma porta, uma ponte,
um desvão, um desvio?
(António Luís Moita)